A Elos de Esperança, associação que há 32 anos dinamiza o voluntariado hospitalar em Portimão, celebrou o Dia Internacional do Voluntário, a 5 de dezembro, com uma sessão solene que deixou todos os presentes «de coração cheio». Aliás, a emoção acabou por contagiar quer a plateia, quer quem discursou no auditório do Museu de Portimão, na manhã de quarta-feira.
O pediatra Luís Batalau foi o primeiro a usar da palavra, em «reconhecimento ao trabalho destes homens e mulheres que diariamente dão, sem nada receber em troca, apoio, ajuda e amor, a todos aqueles que recorrem e necessitam do nosso hospital». E aproveitou para «homenagear os fundadores ou colaboradores que já não estando entre nós, jamais serão esquecidos».
Batalau referiu-se ainda à segunda gala solidária da Elos de Esperança, que aconteceu no dia 24 de novembro, no TEMPO – Teatro Municipal de Portimão, para recordar um episódio da história recente que marcou utentes, profissionais e voluntários do hospital portimonense.
«Infelizmente, calhou-nos em sorte, como presidente do concelho de administração do CHA, um senhor capataz do ministro da saúde de então, que foi destruindo tudo o que cheirava a Serviço Nacional de Saúde. Tudo o que era bom e eficiente. Foi este senhor, aparentemente e tanto quanto me lembro, muito parecido com o Rei D. Carlos I, baixinho, lourinho, de bigode, que destruiu os carrinhos (de distribuição) dos chás, bolachas e sumos, e acabou completamente com esta ação de voluntariado», recordou.
«E porquê? Porque o Hospital de Faro não os tinha. Foi a justificação dada. Como Faro não tinha, Portimão não teria de ter e ponto final. É por esta razão que fazemos galas solidárias, para angariar fundos e também mais voluntários», explicou o pediatra. E concluiu desejando «que o hospital de Faro, merecendo uma aprendizagem humilde, conta com a total disponibilidade do Barlavento e da Elos de Esperança, para construir o seu próprio voluntariado».
Portimão é exemplo de voluntarismo
Álvaro Bila, presidente da Junta de Freguesia de Portimão, «um abraçador de causas sociais», como foi apelidado pela mesa, corroborou o discurso do pediatra. «Nós, portimonenses, somos diferentes. É por isso que Portimão tem tantas associações para ajudar o próximo, e Faro não tem». Castelão Rodrigues, vice-presidente da Câmara Municipal de Portimão, em representação da autarca Isilda Gomes que naquele dia regressava de Bruxelas, lembrou que durante o incêndio de Monchique, em agosto, o Portimão Arena serviu de centro de acolhimento temporário para cerca de mais de uma centena de pessoas. «O voluntariado não organizado que veio dar o seu contributo foi muito grande. Não só ali, mas também na Escola Básica Júdice Fialho, onde nalguns dias que se fizeram 3000 refeições. Às vezes, fomos incompreendidos. Houve pessoas cuja vontade de colaborar era tanta que levavam a mal termos recusado sua ajuda quando já não era necessária. É muito gratificante saber que os cidadãos de Portimão estão sempre disponíveis. E nem é preciso chamar. Vocês, Elos de Esperança, são uma moldura humana que nunca pode acabar». Castelão Rodrigues sublinhou ainda o empenho do atual executivo camarário e da equipa técnica na área social, «matéria em que a nossa presidente tem um coração enorme».
Terapêutica «do carinho e da esperança»
Também o Bispo do Algarve, D. Manuel Quintas, deixou falar o coração. «Vós sois bons não é porque em Faro não há voluntariado. Sois bons por vós mesmos. Que bom seria que o vosso entusiasmo chegasse lá. De facto, esta é uma dimensão que precisa de ser mais desenvolvida. Há tanto bem que está por fazer», disse o prelado. Um argumento seguido por
«As instituições de saúde são autênticas fortalezas porque têm processos internos muitos complexos. É o voluntário que permite fazer a abertura para a comunidade. O voluntário é também um profissional de saúde e um especialista. É o especialista de afetos», sublinhou. «É quem prescreve a terapêutica do carinho e da esperança, fundamental para a recuperação bem estar-físico e psíquico do utente. Espero que mantenham esta motivação e empenho», desejou. Helena Leitão garantiu que vai «pugnar por uma atitude colaborativa entre as diversas unidades para desenvolver projetos que sejam eficazes para a região algarvia». Depois, «espero ser digna de vestir uma batinha amarela, na unidade de Faro e na unidade de Portimão», num trabalho «que deve ser honrado todos os dias».
Federação saudou percurso da associação
«Partilha, fraternidade, humanismo, altruísmo, compromisso, dádiva e tolerância» foram algumas das palavras que Carlos Pinto, presidente da Federação Nacional de Voluntariado em Saúde, usou para mostrar apreço pelo percurso da Associação Elos de Esperança. «O vosso caminho é uma eternidade de gestos partilhados com quem mais precisa, com quem mais sofre, com quem está só e fragilizado. O vosso trajeto tem substância, tem peso e a sociedade portimonense reconhece-o e revê-se nele. Conta convosco para melhorar a qualidade de vida da vossa comunidade. Sois vós em quem os doentes mais confiam para que a estadia no hospital seja menos penosa e menos penalizadora», resumiu.
Carlos Pinto lembrou ainda que o voluntariado é «o que nos distingue dos que praticam o egocentrismo, dos que tudo fazem para ser vistos. Dos que precisam de alguém que lhes carregue a pasta e a mala, cheia de vaidade. Dos que dão para receber e dos que se acham o centro do mundo». Ser voluntário é «contribuir para a melhoria da sociedade, doando tempo e energia, dando o exemplo em nós, para que o mundo seja mais justo. É poder fazer uma diferença na transformação social, exercer a cidadania de uma forma mais intensa e assertiva», sendo que a Direção Geral da Saúde «reconhece esta proximidade», sublinhou. «Bem-hajam pelo destino que moldaram com o vosso coração, focados no bem-estar dos que não têm sorriso, não têm paz, não têm nada, nem ninguém e que são muitos mais do pensamos», concluiu. A mesa da sessão solene foi presidida Ana Ventura, responsável do serviço social da unidade de Portimão do CHUA.
Serviço de Medicina precisa de voluntários
À margem dos discursos, a enfemeira-chefe São Cruz, 32 anos de serviço hospitalar em Portimão, recordou que «quando cheguei, havia duas ou três voluntárias na ortopedia. Os meus colegas não permitiam mais, porque eram donos e senhores das suas enfermarias e não permitiam mais ninguém a lidar com os doentes. Tive o prazer de fazer formação e observar o quão importante é o voluntariado» naquele contexto, disse.
«Está a chegar o Natal. Se as pessoas já não querem levar os seus familiares [hospitalizados] para casa durante o ano, muito menos querem agora», lamentou, alertando para a carência de voluntários no serviço de medicina. «O nosso hospital, tal como outros, está a passar por uma grande falta de auxiliares. Estão reduzidos a metade. Temos falta de quem possa dar uma refeição» aos doentes, exemplificou. São Cruz considerou ainda que «os voluntários formam-se na escola, a estar alerta para os outros», pelo que devem ser os pais a dar o exemplo. Até porque, como disse Maria Fernanda Cabral Teixeira, presidente da Associação Elos de Esperança, «a vida só faz sentido, se nós fizermos sentido a outras vidas».
Homenagens à veteranas e novas batas amarelas
Durante a sessão solene foram entregues as batas amarelas a Lurdes Fernandes, Rui Norte e Luís Caramelo, três voluntários efetivos que terminaram a integração na Associação Elos de Esperança. Foram também homenageados os voluntários Ilda Fernandes e Manuela Mimoso e Odete Vitela . No ano de 2018, nos diversos serviços da Unidade de Portimão do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, os voluntários contabilizaram 20378 horas de voluntariado. Acolheram, encaminharam e orientaram 41547 utentes que se deslocaram para consultas e exames. O projeto «Hora da Partilha» ofereceu 1577 litros de chá e 11181 bolachas.