Procurei não escrever sobre o incêndio de Monchique. Várias vezes ao longo desta fatídica semana fui impelido a expressar a minha mágoa sobre esta tragédia. Evitei. Guardei para mim a tristeza, a desilusão, a revolta. Já tudo se disse e repetiu sobre o que aconteceu. O que deveria ter sido feito e não se fez. O que já se sabia e não se evitou. A abundância de meios e a escassez de sabedoria no combate.
A coragem de muitos e o desespero de outros tantos. E sobretudo, sobre as lições que teimamos em não aprender e pôr em prática na nossa pacata vivência na serra. Mas, ao contrário do que até aqui tem acontecido, as possibilidades de recuperação, começam tornar-se mais difíceis. E exigentes. A nossa resiliente biosfera está cada vez mais esgotada. O clima está diferente. Os residentes do interior, os que mantêm alguma vida neste território, estão a abandoná-lo. Ou a morrer. As práticas quotidianas que outrora estabeleciam um equilíbrio ecológico na floresta e espaço rural há muito que definham, ou desaparecem. O oportunismo fácil e lucrativo, esse, expande-se e aproveita-se das circunstâncias. E de todas as fragilidades, políticas, territoriais, económicas e ambientais. Sobretudo destas últimas.
O incêndio de Monchique é uma catástrofe pela magnitude e vastidão de área afetada. Pelo tremendo impacte que tem e terá na vida das pessoas. Pelos danos ecológicos. E pelos efeitos secundários. Serão estes a ditar o futuro do território. Como manter as poucas pessoas que ainda aí permanecem depois deste acontecimento? Quem vai retomar a sua atividade depois das enormes perdas? Quem arrisca começar tudo de novo, sabendo que é quase certo que ter de passar outra vez pelo mesmo? Se o fenómeno do despovoamento do interior já era intenso, imaginemos como será agora, nos próximos meses ou anos, nesta zona. Quem acredita que as «coisas» vão realmente mudar? Os nossos especialistas e cientistas em assuntos relacionados com a floresta ou as alterações climáticas andam há vários anos a avisar-nos sobre tudo isto. Alguém ouviu e agiu na forma como estes territórios e estes espaços são pensados e geridos? Os próximos anos vão ser decisivos.
Ou há vontade, coragem, interesse e competência para agir e fazer destes territórios aquilo que realmente são – espaços ricos em recursos, fundamentais para a nossa existência sã e feliz, locais de oportunidades de trabalho e qualidade de vida – ou resta-nos lembrar este ano, como mais um que fica na história dos nossos falhanços.
João Ministro é operador de turismo na natureza