Sem um rosto em torno do qual os algarvios se mobilizem na defesa da resolução dos problemas estruturais que afligem a região e que travam o seu progresso, contrariamente ao que sucede noutras áreas do país, não há como potenciar o desenvolvimento económico e social sustentável que os algarvios merecem e que os seus recursos permitem.
Alguém consegue imaginar, por exemplo, uma estrada nacional com as características da EN 125 na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, nomeadamente o troço entre Olhão e Vila Real de Santo António, que estivesse tantos anos por arranjar e requalificar?
Ou algum algarvio acredita que se os hospitais públicos das referidas áreas metropolitas funcionassem com as carências e a crónica falta de recursos humanos que aflige os hospitais de Faro e de Portimão, que não tinha já existido uma revolta dos seus profissionais e utentes, exigindo que se fizessem os investimentos, e que o governo não tivesse disponibilizado o dinheiro necessário para o efeito?
Ou que a carga fiscal que incide sobre o preço dos combustíveis se manteria tão elevada, há tanto tempo, se não existisse uma rede de transportes públicos como a que há em Lisboa e no Porto, pago com o dinheiro de todos os contribuintes?
E não venham os utentes dos transportes públicos dessas áreas metropolitanas dizer que os mesmos funcionam deficitariamente. Pois se isso é verdade, pelo menos existem. No Algarve, nem vê-los.
A pertinência das questões acima colocadas, que traduzem a passividade com que assistimos ao arrastar da requalificação da EN125, ao atraso no início da construção do Hospital Central do Algarve ou a não criação de uma Rede Regional de Transportes Públicos, atestam a nossa falta de capacidade reivindicativa e comprovam a inexistência de uma estratégia concertada entre os diferentes atores políticos algarvios.
Se existisse essa estratégia, ouvíamo-los a falarem a uma só voz contra o abandono a que os algarvios são votados pelos sucessivos governos e a unirem-se em torno de alguém que liderasse a «revolta» que há a fazer contra o centralismo de Lisboa.
Uma descoordenação que prova, se prova faltasse, que o Algarve enfrenta uma crise de representatividade. E sem uma representatividade unificada não temos como alcançar os objetivos comuns que ambicionamos.
É dos livros que as reivindicações coletivas, por mais justas que sejam, só têm possibilidade de êxito se existir um rosto a liderá-las. Porém no Algarve aquilo que temos, lamento escrevê-lo, é uma «região» com 16 quintais, em que cada um dos seus «donos» puxa para o seu concelho o que pode do Poder Central, sem olhar para o interesse do Algarve.
Uma postura que é legítima, pois cada presidente de câmara procura defender os interesses das populações que o elegeram, mas que transforma o Algarve num anão político. Uma desunião que permite ao Poder Central a troca de benesses para os municípios mais afoitos ou partidariamente mais «próximos» do governo, financiada com a riqueza que aqui é criada, ou com a promessa de cargos políticos no futuro, fomentar a divisão daquilo que unido seria um adversário temível. Um Algarve a uma só voz.
É também nesse sentido que me entristece não ouvir o Algarve opor-se, a uma só voz, ao acordo desenhado nos corredores do Palácio de São Bento entre a ANMP e o governo, longe dos nossos olhos, para se regionalizar o país por «via» do municipalismo.
É que quanto mais poder for dado aos municípios, sobretudo àqueles que disponham de recursos para materializar a descentralização que se anuncia, mais distante estaremos da construção do melhor caminho que se conhece, seguido por toda a Europa, para a resolução sustentável dos problemas locais. Um caminho chamado regionalização. Tema a que regressarei numa próxima crónica.
Miguel Madeira | Gestor