A segunda fase do projeto Agitar «surge porque há um grande problema no Algarve, no que toca ao emprego e à integração de pessoas com deficiência na sociedade. Nós propusemo-nos a criar uma plataforma de sensibilização da comunidade, através de projetos ambiciosos e originais, com alguma relevância, para chamar a atenção das pessoas. Os nossos técnicos iam às escolas e às empresas, sempre numa abordagem criativa. Agora, queremos capacitar as pessoas com deficiência a serem elas a fazer este trabalho. Assim, vamos gerar a possibilidade de as empresas virem a contratá-las, e, ao mesmo tempo, estamos a mantê-las ocupadas», explica ao «barlavento» Nuno Miguel Neto, 30 anos, responsável pelas relações externas da Associação do Apoio à Pessoa Excepcional do Algarve (APEXA), formado em arquitetura e coordenador de projetos.
No final de 2016, o LIDL resolveu direcionar 50 por cento do valor da venda de alguns produtos para uma iniciativa de responsabilidade social, com o nome «Promoção do Bem». Durante quatro semanas, esta campanha angariou 368 mil euros, agora distribuídos por cinco instituições de solidariedade social no país: APAV (norte); ACAPO (centro); Acreditar (Lisboa e Vale do Tejo); Rutis (Alentejo) e APEXA (Algarve).
A verba, que ronda os 73 mil euros, permitiu à instituição algarvia transformar uns antigos contentores doados por uma empresa de construção falida, em sala de formação equipada com seis computadores portáteis, com zona de estudo, sala polivalente, gabinete pedagógico para consultas e um estúdio para a produção de conteúdos multimédia, na Guia, à beira da EN125.
«O objetivo deste projeto é resolver a situação de pessoas que têm capacidade para trabalhar. A maior parte são autónomas, têm capacidade de raciocínio e todo um potencial adormecido, mas não estão ativas porque acham que não conseguem. Vamos ensiná-las a criar conteúdos, a produzir uma boa apresentação digital, a fazer story telling, a articular um bom discurso e a falar em público». Segundo Nuno Miguel Neto, o projeto abrange pessoas entre os 18 e os 60 anos com o 9º ano. O curso arranca a 5 de setembro.
Os cursos terão turmas de seis formandos, duas por semana, 12 pessoas em simultâneo. Cada ação dura 48 horas. O objetivo é formar 30 pessoas até final deste ano. Na última semana, os formandos, «em vez de fazerem um teste final, terão que pôr em prática tudo aquilo que aprenderam» em frente aos alunos dos agrupamentos de escolas de Albufeira Poente, Silves e Silves Sul, parceiros do projeto. Toda a componente pedagógica será assegurada pelos técnicos da APEXA, pois esta é também uma oportunidade «de desenvolver competências e de estreitar laços de proximidade com os utentes».
No final, serão escolhidos cinco para obter o Certificado de Competências Pedagógicas (CCP). «No fundo estamos a criar novas oportunidades de emprego para jovens e adultos com necessidades especiais, contribuindo para uma sociedade mais inclusiva. Queremos que após o curso, fiquem aptos para marcar reuniões, gravar spots de rádio e editar vídeo. Claro que isto seria impossível sem o apoio do LIDL. Permitiu reformular a infraestrutura, pagar os recursos humanos, mas não só só. Além do apoio monetário, a marca ainda doa cabazes com bens de primeira necessidade, para que seja possível ajudar ainda mais pessoas», reforça Nuno Miguel Neto. Embora a região esteja a recuperar dos anos da crise, persistem os problemas sociais. «Há muita vergonha. Afeta pessoas que já tiveram uma vida razoável, de classe média. Há quem tenha tido a capacidade e humildade de pedir ajuda, e outras que precisam, mas não pedem», lamenta, sublinhando que a porta está sempre aberta.
Autarcas de Albufeira marcaram presença
Os presidentes da Câmara Municipal, Carlos Silva e Sousa, e da Assembleia Municipal de Albufeira, Paulo Freitas, marcaram presença na apresentação do projeto Agitar, que decorreu na sexta-feira, 11 de agosto, nas instalações da APEXA. Para o presidente da Câmara Municipal de Albufeira, a APEXA é «uma parceira na área social muito importante pelo trabalho que desenvolve na região e no concelho». O autarca desejou ainda «o maior sucesso para este projeto, que está direcionado num sentido tão bonito que é o da igualdade, da inclusão e da não discriminação».
O município de Albufeira tem em vigor um Protocolo de Colaboração com a APEXA, que prevê a cedência, desde 2003, das atuais instalações da associação, situadas no edifício da antiga Escola do Ensino Básico de Valverde, na Guia, bem como a cedência de dois gabinetes na Quinta da Bella Vista, onde a APEXA desenvolve o projeto “Pescadores de Sonhos E5G (Escolhas 5ª geração). A autarquia presta ainda apoio ao nível dos transportes escolares dos alunos portadores de deficiência, com necessidades educativas especiais, residentes no concelho.
Lar Residencial é uma grande lacuna no Algarve
A APEXA trabalha sobretudo em quatros concelhos: Albufeira, Silves, Loulé e Lagoa. «Temos algumas respostas terapêuticas, mas aquilo que a maioria procura», um lar residencial para pessoas com deficiência, «ainda não conseguimos dar». No futuro, «queremos fazer um projeto para o interior do Algarve, de modo a dar apoio aos povoamentos mais isolados, no âmbito do acesso a cuidados de saúde e a bens essenciais». Outra prioridade para 2018 «é continuar o torneio internacional de futebol adaptado em março, e dar resposta ao maior número de pessoas possível».
Sazonalidade é obstáculo à integração
Na opinião de Nuno Miguel Neto, «há vários exemplos no Algarve de integração de pessoas com deficiência. Aliás, quase todas as Instituições Particulares de Solidariedade Social empregam-nas. Todas as funções simples podem ser perfeitamente executadas por pessoas com paralisia cerebral, por exemplo. A Algardata tem um telefonista tetraplégico e o Zoomarine tem jardineiros com síndroma de Down. Também o Jumbo emprega várias pessoas invisuais, com sucesso». «Os empresários no Algarve, em geral, estão muito ligados ao turismo e à sazonalidade, uma palavra associada à ideia que só há emprego no verão. Na verdade, tem muitas mais implicações. Quem tem um emprego sazonal por três meses, se calhar, em termos de esforço físico, mental e psicológico, vale por seis ou sete. Ora para uma pessoa com deficiência este ritmo é muito complicado».
Municípios têm atitudes diferentes face à deficiência
De acordo com Nuno Miguel Neto, 30 anos, responsável pelas relações externas da Associação de Apoio à Pessoa Excepcional do Algarve (APEXA), hoje «nota-se que há uma maior preocupação» com a causa da deficiência. No entanto, esta é uma realidade encarada de forma diferente na região. «Tendemos a olhar para isso com gráficos. Há um concelho no Algarve que tem um diagnóstico social com 270 páginas, no qual reserva duas à deficiência. Sete linhas de texto e quatro gráficos. Mas há outras em que o trabalho está de tal maneira bem feito, que se ligar para a Câmara Municipal a pedir 30 pessoas para um projeto, enviam logo uma lista com os contactos. O trabalho da deficiência no Algarve não parte do governo, nem de ministérios, nem de secretarias de Estado. Parte dos municípios. Alguns têm um trabalho excelente na questão das acessibilidades e no levantamento dos casos e noutros as pessoas continuam a ser números», lamenta.